
Cidade da Praia, 28 Out (Inforpress) – A realizadora cabo-verdiana Samira Vera-Cruz prevê começar a filmar, no início de 2026, um documentário intitulado “Plastic Atlantis [Atlântida de Plástico]”, após novo apoio atribuído ao projeto, desta vez pelo Festival Internacional de Cinema de Berlim (Berlinale).
“O Atlântico acaba por ser uma vala comum dos nossos antepassados”, vítimas da escravatura, “mas também das espécies que morrem porque vão ingerindo microplásticos, que nós também já ingerimos através do que comemos e da água que bebemos. Acaba por ser também a nossa vala comum se nós não mudarmos os nossos comportamentos”, referiu, em entrevista à Lusa.
O projecto, em preparação há alguns anos, é um “documentário criativo e intimista que mergulha nas águas do Atlântico para traçar as correntes históricas que ligam Senegal, Cabo Verde e Brasil”, usadas durante a escravatura, as mesmas que hoje carregam resíduos plásticos, um problema ambiental para todo o planeta.
“É narrado por mim, na minha viagem enquanto cineasta, mergulhadora e pessoa preocupada com o meio ambiente, a tentar compreender, através de conversas com especialistas, as minhas próprias origens”, contou.
Ao mesmo tempo, tenta perceber a relação do povo cabo-verdiano com a natureza: “compreendendo quem nós somos, conseguimos perceber o nosso papel na própria natureza”.
O projecto prevê levar aos ecrãs um trabalho híbrido de 74 minutos, com ‘performances’, “bastante poético”, materiais de arquivo, cinematografia subaquática e com um apelo ao fim do uso de plástico descartável.
“É um problema gravíssimo”, disse, dando o exemplo da ilha de Santa Luzia, desabitada, mas onde vão parar plásticos de todo o planeta, ali depositados pelas marés.
O documentário pretende ser “um grande alerta” sobre a forma como “está tudo ligado: quando nós atiramos com um pedacinho de plástico aqui, ele não desaparece, vai para outro lugar e acaba por ter um impacto negativo”.
O filme pretende também criar “uma campanha de impacto” através dos fundos já garantidos.
Samira Vera-Cruz reconhece que a imagem do Atlântico como uma vala comum pode ser sombria, mas esse é o objetivo.
“Quando trabalhamos com conservação, já foi constatado que não vale a pena dizer ‘não faças isto’, porque a pessoa acaba por fazê-lo, na mesma. O que nós queremos é contar essa história de forma a incomodar, porque o sombrio também tem de ser falado”, disse à Lusa.
Há progressos e ficções entusiasmantes sobre viagens espaciais, mas, no fim do dia, “este é o único planeta que temos, onde podemos viver. Não o preservarmos é algo sombrio, então, temos de falar sobre isso”.
“Mas eu quero também deixar esperança, mostrar que está tudo interligado”, acrescentou.
Ou seja, depois de toda a pesquisa já realizada para o documentário, a realizadora acredita que tudo pode também conjugar-se “na procura por eventuais soluções”.
O orçamento do projeto está assegurado a 42%, referiu, avançando em coprodução com Senegal, Brasil, África do Sul e Alemanha.
Em Berlim, o documentário recebeu, há dez dias, um apoio de 40 mil euros do World Cinema Fund (WCF), mecanismo de apoio ao cinema internacional, através do TUI Care Foundation Award.
Poucos meses antes, já havia sido distinguido no Durban FilmMart 2025 (África do Sul), garantindo apoios financeiros e ligações a outras iniciativas (como o Sheffield DocFest e o Sundance Documentary Fund).
O projeto já havia recebido apoios do Núcleo Nacional de Cinema, do Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas (Cabo Verde), das iniciativas STEPS Generation Africa 2.0 (África do Sul), Visions du Réel Development Lab (Suíça) e do Fundo Takalani Mulaudzi (África do Sul).
O filme será produzido por Pedro Soulé, com a produtora KS Cinema (Cabo Verde).
“A maioria das filmagens vai ser feita em Cabo Verde, nas ilhas de Santiago, São Vicente e Santa Luzia”, além de outros segmentos no Senegal e Brasil, com estreia prevista para 2027, concluiu Samira Vera-Cruz.
Inforpress/Lusa
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