*** Por Margaret G. Lima, da Agência Inforpress ***
Sal Rei, 20 Ago (Inforpress) – A Boa Vista, terra natal do primeiro presidente de Cabo Verde, Aristides Pereira, como todo o país, encontra-se em transformação, 50 anos após a independência, existe uma sensação de a memória desse líder estar esquecida no automatismo da modernidade.
A Inforpress recolheu testemunhos de três gerações da ilha: uma sobrinha-neta, um ex-militar e uma jovem estudante, cujas perspectivas oferecem um panorama sobre o legado de Aristides Pereira e as prioridades da nova era da ilha.
A sobrinha Marina Pereira Silva recorda um homem “simples e acessível”, com um “sorriso e gargalhada” contagiantes, que se diferenciava da figura sisuda e distante muitas vezes retratada.
Segundo a familiar, o antigo presidente era uma pessoa cujos feitos eram guiados pela preocupação com o povo.
Joaquim Ramos, ex-militar e motorista de Aristides Pereira, reforça essa visão, lamentando que o líder, que "queria fazer muita coisa" por um país "completamente de zero", esteja hoje esquecido.
Joaquim Ramos destaca a "euforia política" que a ilha viveu ao ver um dos seus filhos na presidência, mas hoje expressa uma profunda frustração pelo seu "esquecimento” na ilha e em Cabo Verde.
O sentimento é partilhado por Marina Pereira Silva, que expressa “muita falta de reconhecimento” do papel do primeiro presidente e de todos os combatentes e ex-combatentes. Ela acredita que esta ausência de valorização se deve ao facto de o país ainda “não lidar bem com a nossa história”.
A mesma indica que apesar de a família fazer a sua parte, a preservação da memória de Aristides Pereira como figura pública cabe às instituições do Estado – a Câmara, o Governo e os organismos que cuidam da história do país.
A sobrinha de Aristides Pereira afirma ser necessário levar o trabalho que já é feito por associações em Santiago a outras ilhas para as novas gerações.
Na perspectiva da jovem Raquel Moreira, de 18 anos, a memória de Aristides Pereira é um "motivo de orgulho", entretanto, ela concorda que é preciso reforçar o legado de Aristides Pereira, especialmente nas escolas.
Apesar de reconhecer iniciativas como o Aeroporto Internacional Aristides Pereira e a nova estátua na Boa Vista, a jovem defende que a história do líder deve ser ensinada para além do seu papel político, como "exemplo de coragem e serviço ao povo".
As entrevistas também revelam que apesar do peso do turismo da Boa Vista no país, 50 anos depois não se reflecte num desenvolvimento significativo para a população local.
Marina Pereira Silva recorda que grande parte das infraestruturas usadas na ilha, como estradas e a electrificação de povoados, foi realizada na época da presidência de Aristides Pereira.
Já Joaquim Ramos considera o "turismo pobre", que não beneficia directamente os nativos da Boa Vista, e levanta uma séria preocupação com a venda de terrenos na ilha, o que para ele dificulta o planeamento e o desenvolvimento.
Raquel Moreira, por sua vez, aponta a falta de formação profissional em áreas como línguas e empreendedorismo, que impede os jovens de aproveitarem plenamente as oportunidades do setor, e questiona se a cultura e as tradições locais estão a ser "esquecidas" face às influências externas.
Em síntese, 50 anos depois, Boa Vista enfrenta o desafio de equilibrar a sua herança histórica com as exigências de um futuro turístico, há uma perceção do legado de Aristides Pereira ter sido deixado de lado, e que a contribuição turística da ilha ao país não se reflete no seu progresso.
MGL/CP
Inforpress/Fim
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