
Pedra Badejo, 13 Dez (Inforpress) – O avanço persistente de grandes manchas de Sargassum (algas castanhas) ao longo das praias de Santiago Norte está a transformar a paisagem costeira e a rotina das comunidades locais.
Ao mesmo tempo, reacende o debate sobre os efeitos ambientais e socioeconómicos de um fenómeno que continua sem explicação científica conclusiva.
Segundo relatou à Inforpress a presidente da Associação Lantuna, Ana Veiga, nas últimas semanas, foram registadas acumulações significativas de algas em diversos pontos da ilha, tanto na costa Leste como no Oeste, uma realidade que, sublinha, se verifica também noutras ilhas do País.
Porto Mosquito, Baía de Monte Angra e a Praia do Porto de Furna figuram entre as zonas onde a organização trabalha e onde se observa um aumento expressivo das chegadas de algas, com efeitos visíveis na paisagem, no uso das praias e nas actividades de subsistência das comunidades.
Embora a presença massiva de Sargassum no Atlântico seja um fenómeno global monitorizado desde 2011, Ana Veiga lembra que persistem lacunas científicas que impedem explicações definitivas sobre o seu crescimento acelerado.
Entre as hipóteses apontadas por investigadores estão o aumento de nutrientes no oceano, resultantes de descargas fluviais e uso agrícola, além das alterações climáticas, que poderão estar a favorecer a expansão das algas.
“São apenas indicações, nada está concluído”, reforça.
Segundo afirma, o fenómeno em alguns cantos do mundo tem provocado impactos negativos no turismo, com praias menos atractivas e operações constantes de limpeza, e na pesca, onde a presença das algas dificulta o acesso ao mar e o manuseio das embarcações.
Contudo, lembra que o Sargassum não representa apenas uma ameaça, pois, também pode ser uma oportunidade económica.
“Há países que já utilizam estas algas como fertilizante e até como matéria-prima na construção civil. Em Cabo Verde, ainda estamos a começar, mas o potencial existe”, afirmou.
Algumas comunidades começam já a materializar esse potencial. Em Santa Cruz, na Praia de Areia Grande, um grupo de mulheres trabalha diariamente na recolha manual das algas, descrevendo a tarefa como “exaustiva” pela quantidade do produto que chega à costa, mas também como uma fonte essencial de sustento.
“Retiramos todos os dias e ainda há muito para sair”, relatam. As algas são acumuladas em áreas afastadas e posteriormente transportadas por camiões, embora as trabalhadoras admitam desconhecer o destino final do material recolhido, apesar de rumores de aproveitamento agrícola.
Há, porém, experiências concretas no arquipélago. Na localidade de Moia-Moia, mulheres organizadas têm transformado Sargassum em biofertilizantes e outros produtos agrícolas, numa iniciativa que combina protecção ambiental com geração de rendimento.
No projecto, aprendem a recolher, secar e processar as algas, contribuindo para melhorar solos secos e diversificar a produção agrícola local.
Enquanto persistem dúvidas científicas e desafios logísticos, o Sargassum continua a testar a resiliência das comunidades, o alcance das respostas institucionais e a capacidade de inovação local, exigindo soluções que conciliam mitigação de impactos e aproveitamento sustentável dos recursos.
O Sargassum é um género de algas castanhas flutuantes que se desloca em grandes massas impulsionado por correntes marítimas. Estudos recentes sugerem que a sua expansão anómala desde 2011 pode resultar de factores como o aumento de nutrientes transportados por grandes rios, nomeadamente o Amazonas, alterações na temperatura e salinidade da água e mudanças nos padrões de circulação oceânica associados ao aquecimento global.
A proliferação excessiva das algas pode reduzir o oxigénio em zonas costeiras, afectar ecossistemas marinhos e alterar padrões de migração de espécies, reforçando a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e de monitorização contínua.
MC/JMV
Inforpress/Fim
Partilhar