Independência/50 Anos: Agricultores lamentam “falta de investimentos na agricultura e retrocesso” na produção

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Independência/50 Anos: Agricultores lamentam “falta de investimentos na agricultura e retrocesso” na produção
03/07/25 - 01:10 pm

Tarrafal, 03 Jul (Inforpress) – Em vésperas de comemorar os 50 anos da independência de Cabo Verde, os agricultores do município do Tarrafal expressaram preocupação com o que consideram falta de avanços significativos na área agrícola ao longo das últimas cinco décadas.

Segundo relatos colhidos pela Inforpress, as condições actuais reflectem “mais retrocessos do que progressos”, com a agricultura local a sofrer com a escassez de recursos, degradação ambiental e ausência de investimentos estratégicos.

No perímetro agrícola do Colonato, em Chão Bom, a Inforpress conversou com João José Oliveira, presidente da associação de agricultores locais. Oliveira, cuja família tem raízes no Colonato desde a época colonial, destacou que, apesar do potencial histórico e cultural do local, o sector agrícola não recebeu os investimentos necessários para se desenvolver de forma sustentável.

“Desde cedo, acompanhei o trabalho no Colonato, onde os meus avós já trabalhavam. Mas, ao longo dos anos, fomos perdendo espaço devido à falta de apoio e de condições adequadas. O primeiro passo para reverter essa situação seria investir na restauração do meio ambiente, com barragens, diques e na dessalinização da água, além de formação e informação para os agricultores”, afirmou.

Este dirigente relembrou que Amílcar Cabral, era agrónomo e estudioso do sector, daí, seguindo a lógica do fundador das nacionalidades cabo-verdiana e guineense, João Oliveira argumenta que tem sido "necessário desde a época da independência até agora, reforçar a abordagem mais técnica e estruturada" na agricultura, não só no Tarrafal, mas em todo o país.

Esta lacuna de investimento é apontada como a causa do "descaso" num dos sectores "mais importantes" do país.

“Conhecer a terra, as sementes e garantir a sua qualidade é fundamental. Hoje, muitas sementes que recebemos não têm garantia de germinação, o que prejudica a produção. Antes, tínhamos fartura, mas a escassez de água, a falta de investimentos e oportunidades têm nos levado ao atraso”, lamentou.

João José Oliveira defendeu que a agricultura deveria estar na linha de frente do desenvolvimento do país após 50 anos de independência, pois é o caminho para a auto-sustentação, especialmente face a crises como a pandemia da covid-19 e conflitos internacionais.

Além da agricultura, o presidente da associação apontou também a subutilização dos recursos marítimos como uma das causas do declínio económico local.

“Estamos deixando as nossas riquezas marítimas e terrestres escaparem, enquanto outros países exploram esses recursos. Se não tomarmos medidas, vamos perder cada vez mais os nossos talentos, como agricultores, pescadores, pedreiros (…), que buscam melhores condições fora do país”, alerta Oliveira, brincando que, caso a situação persista, Tarrafal pode acabar a se “despovoar”, alertou.

Nesta mesma linha, outra agricultora, Elsa Pires, relatou que a parcela de terra que tem na sua posse foi abandonada por outro proprietário devido à falta de água e de condições para o cultivo.

Apesar dos desafios, ela decidiu assumir o terreno, cultivando batata-doce, tomate, milho e árvores frutíferas e para ela, o avanço na agricultura neste perímetro que considera fértil, depende de investimentos em recursos hídricos, incluindo tratamento da água da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) e da dessalinização do mar.

“Com mais água, podemos aumentar a produção. O nosso potencial é grande, mas a escassez impede que os agricultores prosperem”, afirmou Elsa.

Diante destes relatos, a Inforpress procurou o presidente da Câmara Municipal do Tarrafal, José dos Reis, que reconheceu os obstáculos e destacou as acções em andamento no município.

“Estamos a trabalhar na reactivação de hortas comunitárias, melhorias em poços e na implementação de projectos financiados pelo Fundo Galego de Cooperação e pela cooperação espanhola”, elencou o autarca.

No entanto, José dos Reis salientou que o maior desafio reside na construção de uma central de dessalinização da água do mar, que considera “fundamental para garantir recursos hídricos constantes para a agricultura”.

O presidente da Câmara reforçou ainda que o desenvolvimento do turismo no Tarrafal deve estar aliado a uma forte aposta na agricultura, na pesca e pecuária, visando garantir a produção local suficiente para abastecer o mercado interno e fortalecer a economia do município.

“Para que o turismo seja sustentável, é preciso que o município se auto-abasteça, produzindo os seus próprios alimentos e recursos”, concluiu.

Os agricultores de Tarrafal acreditam que, após 50 anos de independência, é imperativo que se concretizem mudanças substanciais na agricultura local. Investimentos estratégicos na mobilização da água, formação, tecnologia e sustentabilidade são “essenciais” para que o sector agrícola do município retome o seu papel de motor económico, garantindo um futuro mais próspero e sustentável para Tarrafal e para todo o país.

MC/CP

Inforpress/Fim

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