Conclave: Colégio de Cardeais mais diverso numa Igreja a várias velocidades

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Conclave: Colégio de Cardeais mais diverso numa Igreja a várias velocidades
04/05/25 - 10:37 am

Roma 04 Mai (Inforpress) – O Colégio de Cardeais que vai eleger o sucessor de Francisco à frente da Igreja Católica é o mais diverso de sempre, sinal de uma Igreja global com diferentes dinamismos e de um pontificado que nomeou nomes fora do habitual.

Francisco deixou o maior colégio cardinalício da história da Igreja, com 135 cardeais eleitores, sendo que 133 estarão presentes na Capela Sistina.

Em 2013 e 2005 foram 115 os eleitores na Capela Sistina e nos dois conclaves de 1978 foram 111 cardeais. Antes disso, desde 1623 que o número de eleitores não supera os 80 cardeais de 1963, que elegeu Paulo VI.

O sucessor do Papa Francisco será eleito pelo Conclave de cardeais menos europeu e menos italiano de sempre, um sinal das mudanças na Igreja Católica, mas também do dinamismo religioso de outras geografias em comparação com o velho continente.

Francisco deixou um Colégio Cardinalício mais global, menos europeu e menos italiano, retomando a tendência de Paulo VI e João Paulo II, interrompida por Bento XVI.

Nos últimos anos, assumindo-se como o Papa das periferias, Francisco nomeou vários cardeais de países tão diversos como Austrália, Chile, Peru, Sérvia, Japão, Indonésia, Irão, Canadá, Costa do Marfim ou Argélia.

O colégio atual é também feito à imagem da renovação promovida por Francisco: dos 133 cardeais eleitores, 108 (82%) foram escolhidos por si, um sinal de que a sua sucessão será marcada pelo seu carisma.

A forma como o debate interno foi promovido por Francisco ao nível paroquial, diocesano e continental mostrou uma Igreja a várias velocidades.

A igreja latino-americana, particularmente a hispânica, tem dado mostras de defesa de movimentos progressistas, sendo acompanhada pelas dioceses europeias, que se debatem há muitos anos com o abandono da prática religiosa dos fiéis.

Nos anos 1970 e 1980, vários teólogos sul-americanos defenderam ações mais intensas da Igreja na defesa dos direitos humanos, dos povos indígenas, da ecologia e da democracia perante as ditaduras de direita.

Esse movimento foi designado de Teologia da Libertação e foi castigado pela Congregação para a Doutrina da Fé, liderada pelo então cardeal Ratzinger, futuro Bento XVI, que considerou as ideias demasiado próximas do marxismo.

Nos anos 1990, debateu-se a Nova Evangelização da Europa, que teve o então cardeal português José Policarpo como um dos seus ideólogos, e, nesse processo, nasceram movimentos novos nas dioceses, dando mais poder aos leigos face à ausência de vocações sacerdotais.

Este movimento deu frutos, envolveu as comunidades locais e inspirou o Processo Sinodal lançado em 2021 pelo Papa.

A Igreja católica norte-americana é uma das mais ricas do mundo e tem oscilado entre lideranças conservadoras no passado recente e responsáveis mais progressistas, agora nomeados por Francisco.

Tradicionalista, apoiada na herança imigrante de italianos e irlandeses, que se opõe ao pragmatismo protestante e puritano, mas também ao movimento neopentecostal evangélico, a Igreja Católica norte-americana foi fortemente atingida pelos escândalos sexuais.

Em África, apesar do crescimento dos movimentos evangélicos, financiados pelos EUA, a Igreja Católica continua em crescimento, graças aos esforços missionários europeus, apenas ameaçado pelo conflito nas fronteiras com o islão.

Países em guerra civil mais ou menos declarada como a Nigéria, Camarões, República Centro-Africana, Sudão do Sul ou o Quénia constituem as guardas avançadas da resistência cristã contra o avanço islâmico, protagonizado por movimentos como o Estado Islâmico ou o Boko Haram, que são mais rigorosos e têm recusado as práticas sincréticas de boa convivência dos últimos séculos.

Por isso, num continente ferido por guerras religiosas e sem falta de vocações, a hierarquia é pouco sensível aos temas fraturantes, como a abertura às mulheres e homossexuais ou à discussão do celibato sacerdotal.

A única exceção recente neste conservadorismo foi o uso de preservativo, o único momento em que a Igreja africana liderou o debate interno, também por causa dos índices galopantes de HIV.

A Ásia é outro continente conservador, com muitos católicos a defenderem o respeito das normas e tradições, num contexto de disputa com religiões também elas fortemente ritualistas, como o hinduísmo, budismo ou xintoísmo.

A principal exceção é Antonio Tagle, o cardeal filipino que chegou a ser criticado pelo seu próprio episcopado por querer promover um caminho sinodal que dava prioridade às propostas dos leigos por contraponto aos religiosos.

No conclave que começa na quarta-feira, a Europa tem 53 cardeais eleitores (39% do universo eleitoral), um número muito abaixo do habitual nos colégios anteriores. Em 2013, aquando da eleição de Francisco, o número de europeus era de 60 (52,2%), e em 2005, esse número era de 58 (49,5%).

Entre os eleitores, o país que tem mais cardeais é Itália, com 17 (12,6% dos votos), seguida dos EUA (10, 7,4% dos votos) e do Brasil (7).

A redução do peso da Itália no colégio cardinalício tem sido uma tendência, com menos 10 eleitores do que em 2013 (23,1% dos votos).

Em 1978, aquando da eleição do último papa italiano (João Paulo I), os italianos representavam 22,5% e em 1939, a maioria (54,8%) do colégio eleitoral tinha nacionalidade italiana.

O peso da Igreja italiana também foi reduzido por Francisco. O Papa nomeou menos cardeais e ordenou a fusão de parte das 227 organizações diocesanas do país. Portugal, por exemplo, tem apenas 21 dioceses.

Perante a falta de decisão dos bispos italianos de reorganizarem o seu mapa administrativo, Francisco recusou nomear novos responsáveis para as dioceses que ficam com lideranças vagas, ordenando a outros prelados a acumulação de funções em mais do que uma estrutura.

No total, há 42 dioceses italianos sem bispos, um sinal do ‘braço-de-ferro’ entre Francisco e a Conferência Episcopal Italiana, liderada por Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha e um dos candidatos à sucessão de Francisco.

O Brasil é o país lusófono com mais cardeais eleitores (7), seguido de Portugal (4), numa lista que inclui Cabo Verde e Timor-Leste, com um cada.

O primeiro conclave data de 1274, pelo então Papa Gregório X, que aprovou a realização da reunião magna dos cardeais eleitores num local à porta fechada (com chave), até que fosse escolhido o novo líder da igreja.

A institucionalização do conclave como forma de escolha da sucessão papal deveu-se à demora na escolha anterior, que colocou o papado em sede vacante durante quase três anos.

Por norma, desde essa data, a escolha do sucessor do trono de Pedro é feita entre os cardeais eleitores, uma tradição que se mantém desde o século XVI.

Inforpress/Lusa

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